Universidades devem preparar estudantes para tempos de incerteza

Elton Alisson | Agência FAPESP – Além da missão de educar e de capacitar os milhares de estudantes que forma anualmente para transformar o que aprenderam em algo de valor para a sociedade, as universidades devem prepará-los para enfrentar as incertezas do mundo globalizado.

As instituições universitárias, contudo, ainda não estão suficientemente preparadas para enfrentar esse desafio, avaliou Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular este ano da cátedra José Bonifácio do Centro Ibero-Americano (Ciba) da Universidade de São Paulo (USP), durante palestra na abertura da conferência comemorativa do aniversário da Magna Charta Universitatum, no dia 20/10, em São Paulo.

Realizado pela primeira vez fora da Europa, o evento que ocorre anualmente tem o objetivo de discutir os atuais desafios para as universidades preservarem os valores e princípios fundamentais estabelecidos na Magna Charta Universitarium.

Lançado em setembro de 1988, no aniversário de 900 anos de fundação da Università di Bologna, na Itália – considerada a universidade mais antiga do mundo ocidental, fundada em 1088 –, o documento foi assinado naquela ocasião por 388 reitores. Dentre eles, José Goldemberg, então reitor da USP e atual presidente da FAPESP.

Atualmente, 805 reitores de universidades situadas em 85 países subscrevem o documento. Os três últimos foram os reitores das Universidades Federais do Rio Grande do Sul (UFRGS) e de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade do Minho, em Portugal, que assinaram a Magna Charta durante uma cerimônia realizada no dia 21/10 na Sala do Conselho Universitário da USP.

Um dos princípios fundamentais estabelecidos pelo documento é que a universidade é uma instituição autônoma que, de modo crítico, produz e transmite conhecimento através da pesquisa e do ensino. E que, nas universidades, a atividade didática é indissociável da pesquisa.

Essa missão de produzir e transmitir conhecimento por meio da pesquisa e do ensino tem sido cumprida diligentemente pelas melhores universidades no mundo, como a USP, avaliou González. "O cumprimento dessa missão, inclusive, é usado como critério de qualificação das universidades nos rankings internacionais", ressaltou.

As universidades, contudo, não têm dado muita atenção para capacitar os estudantes que coloca no mercado para transformar o conhecimento em algo de valor para a sociedade – por meio do estímulo ao empreendedorismo e à inovação, por exemplo –, e ainda não estão prontas para prepará-los para as incertezas do mundo globalizado, ponderou.

"Vivemos uma revolução tecnológica que rompeu a barreira do tempo e do espaço da comunicação, aumentou a velocidade de circulação do capital e colocou em crise nossa ideia do Estado-Nação como o âmbito de realização da soberania, da identidade da moeda e do mercado, entre outros impactos, que têm tornado o presente e o futuro cada vez mais incertos", avaliou González.

"As universidades não estão preparadas para ajudar os estudantes a lidar com essas incertezas", apontou.

Uma das razões para essa falta de preparo das universidades, na opinião dele, é que o pensamento dos educadores, a exemplo dos pais, está mais voltado para garantir aos jovens um futuro próspero, de plena realização pessoal e profissional, sem levar em conta o imponderável.

"Como dizer ao jovem que estamos educando que a maior certeza que temos hoje é que temos que prepará-los para incertezas causadas por mudanças abruptas, que exigem flexibilização e conhecimento contínuo?", questionou González.

O advogado e político espanhol tem se dedicado a estudar e discutir com outros pesquisadores no âmbito da cátedra José Bonifácio os desafios da governança na democracia representativa e os impactos da globalização na soberania dos países.

Na avaliação de González , a globalização tem gerado uma desigualdade insustentável na distribuição de riqueza no mundo e no ingresso às universidades.

"Mesmo em países que experimentaram um crescimento econômico acelerado nos últimos anos, como a China, além de outros, como a Dinamarca, Estados Unidos, Espanha e países da América Latina, como o Brasil, o acesso à universidade ainda é muito desigual", afirmou.

A ampliação do acesso ao sistema de educação e de formação profissional é um componente fundamental para enfrentar a desigualdade na distribuição de riqueza no mundo, avaliou.

"O acesso ao sistema educacional e de formação profissional representa um dos mecanismos mais eficazes de distribuição de renda porque permite a igualdade de oportunidades de melhores salários" avaliou.

Ação conjunta

Na avaliação de Sijbolt Noorda, presidente da Magna Charta Observatory – uma associação criada em 2000 com o objetivo de monitorar a situação da liberdade acadêmica e autonomia institucional das universidades signatárias do documento –, os desafios impostos pela revolução na informação terão que ser atacados de forma conjunta pelas instituições de pesquisa e ensino superior no mundo.

"Os desafios não serão solucionados localmente e atacados integralmente. As universidades estão sendo pressionadas a unir suas forças para buscar soluções conjuntas. Por isso, viemos pela primeira vez à América Latina e nos próximos anos devemos ir para África e Ásia", afirmou.

O próximo encontro anual da entidade será realizado na University of Pécs, na Hungria.

A edição do evento no Brasil teve como principais palestrantes, além de González, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso e a embaixadora do México no Brasil, Beatriz Paredes Rangel.

Mais informações sobre a Magna Charta Universitatum podem ser obtidas em www.magna-charta.org/.

 

Fonte: http://agencia.fapesp.br/universidades_devem_preparar_estudantes_para_tempos_de_incerteza/24197/

Elton Alisson | Agência FAPESP – Além da missão de educar e de capacitar os milhares de estudantes que forma anualmente para transformar o que aprenderam em algo de valor para a sociedade, as universidades devem prepará-los para enfrentar as incertezas do mundo globalizado.

As instituições universitárias, contudo, ainda não estão suficientemente preparadas para enfrentar esse desafio, avaliou Felipe González, primeiro-ministro da Espanha entre 1982 e 1996 e titular este ano da cátedra José Bonifácio do Centro Ibero-Americano (Ciba) da Universidade de São Paulo (USP), durante palestra na abertura da conferência comemorativa do aniversário da Magna Charta Universitatum, no dia 20/10, em São Paulo.

Realizado pela primeira vez fora da Europa, o evento que ocorre anualmente tem o objetivo de discutir os atuais desafios para as universidades preservarem os valores e princípios fundamentais estabelecidos na Magna Charta Universitarium.

Lançado em setembro de 1988, no aniversário de 900 anos de fundação da Università di Bologna, na Itália – considerada a universidade mais antiga do mundo ocidental, fundada em 1088 –, o documento foi assinado naquela ocasião por 388 reitores. Dentre eles, José Goldemberg, então reitor da USP e atual presidente da FAPESP.

Atualmente, 805 reitores de universidades situadas em 85 países subscrevem o documento. Os três últimos foram os reitores das Universidades Federais do Rio Grande do Sul (UFRGS) e de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade do Minho, em Portugal, que assinaram a Magna Charta durante uma cerimônia realizada no dia 21/10 na Sala do Conselho Universitário da USP.

Um dos princípios fundamentais estabelecidos pelo documento é que a universidade é uma instituição autônoma que, de modo crítico, produz e transmite conhecimento através da pesquisa e do ensino. E que, nas universidades, a atividade didática é indissociável da pesquisa.

Essa missão de produzir e transmitir conhecimento por meio da pesquisa e do ensino tem sido cumprida diligentemente pelas melhores universidades no mundo, como a USP, avaliou González. "O cumprimento dessa missão, inclusive, é usado como critério de qualificação das universidades nos rankings internacionais", ressaltou.

As universidades, contudo, não têm dado muita atenção para capacitar os estudantes que coloca no mercado para transformar o conhecimento em algo de valor para a sociedade – por meio do estímulo ao empreendedorismo e à inovação, por exemplo –, e ainda não estão prontas para prepará-los para as incertezas do mundo globalizado, ponderou.

"Vivemos uma revolução tecnológica que rompeu a barreira do tempo e do espaço da comunicação, aumentou a velocidade de circulação do capital e colocou em crise nossa ideia do Estado-Nação como o âmbito de realização da soberania, da identidade da moeda e do mercado, entre outros impactos, que têm tornado o presente e o futuro cada vez mais incertos", avaliou González.

"As universidades não estão preparadas para ajudar os estudantes a lidar com essas incertezas", apontou.

Uma das razões para essa falta de preparo das universidades, na opinião dele, é que o pensamento dos educadores, a exemplo dos pais, está mais voltado para garantir aos jovens um futuro próspero, de plena realização pessoal e profissional, sem levar em conta o imponderável.

"Como dizer ao jovem que estamos educando que a maior certeza que temos hoje é que temos que prepará-los para incertezas causadas por mudanças abruptas, que exigem flexibilização e conhecimento contínuo?", questionou González.

O advogado e político espanhol tem se dedicado a estudar e discutir com outros pesquisadores no âmbito da cátedra José Bonifácio os desafios da governança na democracia representativa e os impactos da globalização na soberania dos países.

Na avaliação de González , a globalização tem gerado uma desigualdade insustentável na distribuição de riqueza no mundo e no ingresso às universidades.

"Mesmo em países que experimentaram um crescimento econômico acelerado nos últimos anos, como a China, além de outros, como a Dinamarca, Estados Unidos, Espanha e países da América Latina, como o Brasil, o acesso à universidade ainda é muito desigual", afirmou.

A ampliação do acesso ao sistema de educação e de formação profissional é um componente fundamental para enfrentar a desigualdade na distribuição de riqueza no mundo, avaliou.

"O acesso ao sistema educacional e de formação profissional representa um dos mecanismos mais eficazes de distribuição de renda porque permite a igualdade de oportunidades de melhores salários" avaliou.

Ação conjunta

Na avaliação de Sijbolt Noorda, presidente da Magna Charta Observatory – uma associação criada em 2000 com o objetivo de monitorar a situação da liberdade acadêmica e autonomia institucional das universidades signatárias do documento –, os desafios impostos pela revolução na informação terão que ser atacados de forma conjunta pelas instituições de pesquisa e ensino superior no mundo.

"Os desafios não serão solucionados localmente e atacados integralmente. As universidades estão sendo pressionadas a unir suas forças para buscar soluções conjuntas. Por isso, viemos pela primeira vez à América Latina e nos próximos anos devemos ir para África e Ásia", afirmou.

O próximo encontro anual da entidade será realizado na University of Pécs, na Hungria.

A edição do evento no Brasil teve como principais palestrantes, além de González, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso e a embaixadora do México no Brasil, Beatriz Paredes Rangel.

Mais informações sobre a Magna Charta Universitatum podem ser obtidas em www.magna-charta.org/.

 

Fonte: http://agencia.fapesp.br/universidades_devem_preparar_estudantes_para_tempos_de_incerteza/24197/

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